terça-feira, 12 de junho de 2012

CARTA DO TERCEIRO ESTADO AO REI DE PORTUGAL DOM DUARTE PIO DE BRAGANÇA


Meu Rey e Senhor,

O meu país tem um Rei. Poderá ser um Rei algo distante, um Rei cercado que cresceu em palácios com objectos etiquetados de onde a qualquer momento poderia ser obrigado a partir despojado. Um Rei algo tímido e que talvez, por vezes, se sinta em perigo. Um Rei que só por existir e ser quem é a...meaça - certamente sem o querer - os poderosos do momento. Esses que poderão ter tudo mas que não terão nunca o amor deste povo que não os deseja e não os reconhece. Apenas os suporta.
Poderosos sim, mas de sangue ainda mais plebeu do que o meu porque sangue corrompido e vil. Poderosos que não respeitamos, nem desejamos, poderosos que nós - os sem poder - suportamos porque a isso nos obrigam. Ó Rey da minha alma, também Vosso povo está cercado. Está cercado, mas não se rende: resiste e aguarda.

O meu país tem um Rei. Um Rei que talvez nem saiba que eu existo e que não me conhece, não me reconhece e para quem talvez até a minha lealdade possa ser incómoda porque o poderá fazer perigar. Mas o meu país tem um Rei que vive em Portugal e que nunca deixou o trono vazio. O meu país tem um Rei que nunca fugiu, nunca nos abandonou, nunca virou costas, nunca foi para outras bandas "tratar da vidinha". O meu país tem um Rei que nunca se escondeu, nunca se negou e nunca nos traiu. Um Rei que sabe (e durante muito tempo pareceu ser o único a sabê-lo) que este país é e tem que ser muito mais do que apenas obscuros negócios e auto-estradas.

O meu país tem um Rei que é o garante da minha identidade, da minha língua e da minha liberdade. O meu país tem um Rei e porque o meu país tem um Rei algo da minha antiga força e dignidade não será nunca destruída. Porque o meu país tem um Rei eu terei sempre esperança. Porque o meu país tem um Rei e eu tenho História, não serei nunca ( como alguns pretendem) um erro ou um anacronismo. Porque o meu país tem um Rei eu pertencerei sempre ao Terceiro Estado, mas terei orgulho nisso. Porque - ainda que do Terceiro Estado - terei nisso o meu valor, dignidade e direitos. É que ser do Terceiro Estado do Reino de Portugal, é sempre muito mais do que não ser nada, nem ninguém, num mundo sem fronteiras onde os pretensos senhores são apenas os que tudo vendem e trocam.

Porque tenho uma História, uma língua e um Rei, eu não estou á venda, nem aceito ser escrava de senhores e povos estranhos. Servirei, trabalharei e a minha vida não será nunca fácil porque sou do Terceiro Estado. Mas servirei e trabalharei pelos que falam a minha língua e - ainda que de forma longínqua - transportam também o antigo sangue destas terras e destas águas. De Vieira do Minho a Vieira de Leiria, de Gonçalves a Guerras, Almeidas, Simões e Oliveiras, nunca meus longos avós, ainda que livres, viveram sem trabalhar. A Vós a protecção, a nós o trabalho. Porque, meu Rey, eu sou do Terceiro Estado, mas sou forte e sou leal e, sem desejo de honras, glórias ou vãs vaidades que me repugnam, apenas Vos quero pedir que nunca Vos esqueçais de que tendes uma Terra, um Povo e uma Língua que são por Direito Próprio Vossas e de Vossos Filhos e de mais ninguém. Lembrai-Vos, meu Rey e Senhor que o Terceiro Estado nunca vos traiu e que Vos prefere e espera por Vós. O Terceiro Estado não conheceu nunca outros Reys, senão Vós e Vosso Pai.

O Terceiro Estado sabe que será sempre Terceiro Estado, mas prefere-se convosco do que sem Vós - porque sabe que sempre o guardareis melhor e o respeitareis mais. O Terceiro Estado sabe que Sois Grande e que Sois Nobre; o Terceiro Estado sabe que lhe Sois superior por nascimento e educação, mas sabe também que, apesar disso e talvez por isso mesmo, sempre o tratareis melhor do que estes que nos roubam e humilham como nunca Rey algum nos vendeu ou humilhou. O Terceiro Estado prefere-Vos e deseja-Vos, o Terceiro Estado só a Vós reconhece direitos e autoridade.

Rey da minha alma portuguesa, guerreira e lusitana, Rey da minha alma de poetas e de galegos, Rey a quem o nosso sangue deu um Império e o Mar e que nos deste também um Império e o Mar, meu Rey, minha Rainha, Infantes de Portugal, não queremos voltar a ser servos de Castela, servos sim, mas Vossos Senhor - que ser servos Vossos é o mesmo que não servir ninguém, porque servir- Vos a Vós é servir-me a mim mesma, à minha pátria e ao meu sangue. Quero apenas que saibais, meu Rey e Senhor, que o Terceiro Estado não esqueceu ainda a antiga e Sagrada Aliança que une o Rey ao seu povo e que por isso aqui estamos, parecendo adormecidos, mas despertos. Prontos a agir, Senhor, quando o ordenardes.

E porque também em mim há algo maior do que eu mesma, pelo direito de sangue que me assiste desde a noite dos tempos em que meus longínquos avós me legaram esta pátria e este sangue puro e límpido que à Vossa Família para sempre consagrou a sua lealdade e a quem, em troca, deve a sua língua e liberdade, assino em nome do povo e pelo povo,

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